terça-feira, 29 de setembro de 2015

Crise!

Crise têm sido uma das palavras mais repetidas no noticiário (nacional e internacional) ultimamente. Seja na política, seja na economia, seja na ecologia ou no clima, há constatações de desequilíbrios, descasos, ilícitos e similares que vaticinam perspectivas pessimistas.
Contudo, creio que períodos de crise são sempre períodos e há neles sempre a possibilidade de grandes guinadas rumo ao seu contrário.
A arte, aliás, faz-se muito dos momentos de dificuldade. Nosso estado de atenção às coisas e nossa criatividade tornam-se mais simples e latentes. A estabilidade e o sossego não fazem, definitivamente, parte do artista, ser cuja sensibilidade treinada de modo intenso e exaustivo o leva, não raro, às "vanguardas" de seu tempo, seja este qual for. 
Lembro agora dos versos abaixo que escrevi em 2008, postado aqui mesmo em setembro daquele ano - exatos sete anos e cinco dias. Resolvi recompartilhá-los e, de alguma forma, revisitar o Izak que os escreveu.
Hoje vejo que a minha experiência de ator, nas salas de ensaio e de aula (ainda na graduação, naqueles anos, de inquietudes à busca da melhor expressão interior e corporal para cada personagem, incidiram bastante na motivação dessa escrita.




Me coloco permanente no lugar da crise
Porque só dela é que posso sair algo novo.
Por isso acho sempre que não acho
Para ver se me acho
Aonde saberei que não sabia.
Filosofia.
É me achando vazio que
intuitivamente, mais que em movimento, ajo
e já, tão logo, de repente,
me descubro de algo novo preenchido.


(Izak Dahora)

terça-feira, 22 de setembro de 2015

A 'obra de arte total' do carnaval: multiplicidade artística e hibridação nos desfiles contemporâneos das escolas de samba"

Há praticamente um ano defendia minha dissertação de mestrado, intitulada “A 'obra de arte total’ do carnaval: multiplicidade artística e hibridação nos desfiles contemporâneos das escolas de samba".
Quem acompanha, mesmo sem maior interesse, os desfiles em questão, percebe a grandiosidade e a abundância de elementos artísticos hoje envolvidos nessa manifestação que têm sido reconhecida contemporaneamente, por leigos e estudiosos, como espetáculo.
Música, artes plásticas, teatro, dança, vídeo, performance, arquitetura (da própria configuração espacial total do “sambódromo”) e toda sorte de formas possíveis - que vão das formas de artesanato da cultura popular e materiais plásticos (muitos destes reciclados), passando por intervenções circenses, até à pirotecnia de linguagens tecnológicas de última geração – são assimiladas pelas escolas de samba. E é exatamente isso que faz com que cada desfile possa ser abordado não só como apresentação de contornos artísticos e teatralizados, bem como uma “arte total”, cujo funcionamento cada vez mais esmerado e orgânico entre suas partes, chega mesmo a aludir proposições estéticas ambiciosas da história do espetáculo, como o Gesamtkunstwerk (“obra de arte total” ou “obra de arte comum”), desenvolvido pelo compositor e diretor alemão Richard Wagner, à busca de uma restauração do sentido totalizante da arte trágica dos gregos, para ele deturpado pelo individualismo moderno e materializado na forma da ópera.



A comissão de frente da Vila Isabel (2009) mostra a minúcia da composição
teatral empregada nos desfiles em representação da Commedia dell'arte.Toda a dilatação gestual
e expressiva denota o quanto a forma dos desfiles aproximam-se da noção estética da ópera,
grandiosa e excessiva por natureza.
Fonte da imagem: extra.globo.com

Minha dissertação (cuja pesquisa ainda se desdobra) foi, então, antes de tudo uma proposta: de abordar, sob inspiração do conceito wagneriano, cada um dos desfiles como “obra de arte total” atual, brasileira e nossa; com especificidades de uma ópera popular que se dá fora do tradicional edifício teatral, ou seja, na rua, sob as hostilidades das intempéries possíveis e, ao mesmo tempo, sob as generosidades do “céu aberto” (em suas vastas possibilidades de encenação, instigando de modo frequente a ocupação do próprio espaço aéreo).    
Um dos paraquedistas que abriram o desfile da Portela (2015), evidenciando como as escolas investem em aparatos de elevada tecnologia ou de alto investimento financeiro, preenchendo o espaço aéreo (dentro das imensas dimensões do "sambódromo", de elevadas arquibancadas); e criando imagens de impacto, em conformidade com os tempos atuais de "sociedade do espetáculo" e com as "necessidades" da transmissão televisiva.
Fonte da imagem: carnaval.uol.com.br
Os desfiles formam uma manifestação artística e cultural que se beneficia - a meu ver, de modo, substancial – de nosso espaço-tempo da miscigenação étnica e cultural brasileira, que possibilita o encontro de referências artísticas tão diversas: a ancestralidade rítmica/percussiva de matriz negra; a sofisticação harmônica (musical e estética, como um todo) da cultura operística europeia; o sentido sempre tênue (e ainda presente) entre expressão artística autônoma e ritual religioso, afirmado por nossas tradições  ameríndias, afro-brasileiras e católicas, expressas em cânticos, representações, cortejos e danças dramáticas.
Estruturas da forma dos desfiles      
1)Em linhas gerais, entendamos a forma da arte total dos desfiles das escolas de samba a partir de um elemento básico da cultura popular: a procissão. É ao longo do cortejo que a teatralidade desse carnaval estrutura-se; e nesse curso todo um sentido narrativo e dramático é desenvolvido, reservando os mais diferentes quesitos (em suas potencialidades expressivas) para cada etapa do desfile. A aparição do último carro alegórico carrega sempre a função de clímax dentro do curso narrativo a partir do enredo; ou o próprio casal de mestre-sala e porta-bandeira (quando vêm depois da comissão-de-frente ou depois, à frente da bateria) lida, via de regra, com o emocional do público, seja pela distinção da sua dança (clássica), seja por ostentarem o pavilhão, símbolo maior de pertencimento à agremiação.    
A visão aérea mostra o caráter processional dos desfiles (isto é, que se desenvolve em diferentes etapas em cortejo).
Através da imagem observamos a distribuição da "arte total" do carnaval das escolas de samba, um apanhado
de diferentes formas, cores, texturas, volumes e também sons.
Fonte da imagem:  www.archdaily.com.br

2)Cada desfile faz-se do somatório de alas, setores e alegorias. Ou seja, trata-se de uma organização cujo princípio é a montagem de elementos diversos. E este termo, “montagem”, não é ocasional. Remonta as vanguardas estéticas do começo do século XX, período em que os desfiles das escolas foram plasmados (anos 1920), através de movimento da elite intelectual (representada por setores como a academia e a imprensa) que entenderam ser necessária a produção de uma nova imagem da identidade nacional, alicerçada agora na ideia da miscigenação étnica e cultural.

A tela "Samba"(1925), do pintor Di Cavalcanti, exemplifica como o olhar da elite intelectual passou
a enxergar de forma positiva e a valorizar os aspectos das culturas popular e negra
como elementos formadores da identidade brasileira com o advento
da visão modernista.
Fonte da imagem: www.olimpiadadehistoria.com.br

Os desfiles, deste modo, mesmo quando ainda não eram investidos de intenso vigor plástico (por opção ideológica que enaltecia a simplicidade folclórica e uma ideia de “tradição”), já prenunciava um sentido modernista de obra ao justapor elementos artísticos díspares, de modo análogo aos princípios de criação das vanguardas estéticas europeias, como a colagem cubista que “montava” imagens a partir de materiais de naturezas distintas (como areia, jornal, tinta etc no mesmo quadro), constituindo-se como um verdadeiro mosaico.   
3)São tantos os elementos e materiais envolvidos em cada desfile que não raro observam-se em sua forma tensões e aparentes contradições. Uma delas é a existente entre o sentido narrativo desenvolvido a partir do enredo (que tende a estabelecer sentido(s) comum(ns) de leitura) e o caráter alegórico, também fortemente presente na forma dos desfiles, e que aponta em sentido contrário à causalidade narrativa, ao irromper em uma só alegoria intensa dinamização sensorial e semântica na sua constituição híbrida que traz elementos já portadores de histórias, naturezas, vibrações.    
4)Dada a quantidade gigantesca de profissionais envolvidos na elaboração de cada desfile, surge a necessidade afirmar o caráter coletivo de criação (ainda que sob uma condução geral do carnavalesco) através da problematização do sentido de autoria.
Arte do futuro
Através do Gesamtkunstwerk, Wagner anunciava a “obra de arte do futuro”, sua feição e seu comportamento. Segundo o compositor, o futuro necessário da arte seria o da cooperação entre as potencialidades das formas artísticas, no que chamou de "ciranda das artes irmãs". Dentro desta perspectiva, cada arte deveria abdicar de sua condição individualizada para a geração de uma expressão artística de força inesgotável e capaz de revolucionar o humano através da sensibilidade e da experiência coletiva. Podemos ver no contemporâneo, uma possível efetivação dos, pelo menos em parte, dos ideais wagnerianos, uma vem que as artes hoje reconhecem seus limites e experimentam interfaces, diálogos, interdependências. 
Fiz neste texto um apontamento geral de minha dissertação trazendo algumas das questões que movimentaram a pesquisa. Que este breve apanhado possa estimular a leitura da dissertação em si e o aprofundamento dessas e de outras questões relativas à abordagem dos desfiles como demonstrações de arte total. Segue o link, abaixo: 
http://www.bdtd.uerj.br/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=7319



As escolas de samba afirmam o seu "barroquismo" (qualidade semelhante a das origens da ópera no século XVI) através de suas estruturas alegóricas (que tendem à própria fragmentação do discurso) tamanho o detalhamento formal (de altos e baixos, dobras, reentrâncias etc).
Fonte da imagem: oglobo.globo.com



O uso intensivo de tecnologias de última geração confirmam a inserção dos desfiles nas formas e nos discursos da contemporaneidade. No abre-alas do Salgueiro (2011), vemos a imagem de parte
da plateia projetada em um telão de led, demonstrando uma busca de (re)inserção do público
em um cada vez mais fechado sistema de representação.
Fonte da imagem: veja.abril.com.br



"Que horas ela volta?"



Assisti a "Que horas ela volta?" Um filme que merece ser visto porque fala muito de nós como país, cuja sociedade altamente estratificada teve historicamente a rígida definição dos espaços de uma elite e de uma não elite (delegada à "inferioridade" do trabalho propriamente dito), num jogo em que cada classe deveria saber os limites do "seu lugar". "Que horas ela volta?", quase despretensiosamente, com o humor e os afetos que nos ligam ("cordialmente") nessa sociedade de herança escravocrata, divisões, classismos e preconceitos, mostra também um Brasil contemporâneo, crivado ainda por estruturas coloniais da "casa grande e da senzala", mas que se renova em um quadro social mais dinâmico, de novos personagens ativos e possibilidades. Um filme indispensável.

Minhas memórias do Manga


Eu estava ansioso no dia em que iria conhecer o Manga. Devia ter uns dezoito anos, era meu sexto e último ano de "Sítio" e eu sabia da sua grandeza. Afinal, assisti do final da infância à adolescencia praticamente todos as "chanchadas" da Atlântida, muitas das mais bem-sucedidas delas dirigidas por Manga e estreladas por Oscarito e Grande Otelo. Na verdade, "chanchada" era uma forma pejorativa encontrada pela critica para rotular filmes despretensiosos esteticamente, de humor ligeiro e popular, e que muitas vezes serviam mesmo de base para lançamentos de músicas que seriam sensação no periodo carnavalesco. Havia uma forte influência do teatro de revista (gênero teatral popular) de bastante apelo musical.
As chanchadas eram tudo isso e divertiam por serem exatamente isso: um bom pedaço do modo de ser brasileiro mais simples e irreverente. Como sempre fui um ser curioso e que, por isso, aprendi a flertar com o passado, desbravava com encanto, através do Canal Brasil, os filmes não só da Atlântida bem como da Cinédia, da Herbert Richers e tambem da Vera Cruz (a mais seria de todas do inicio do nosso cinema, de produções épicas emuladas por Hollywood. Manga viria justamente para modernizar a chanchada, levando maior rigor técnico (inspirado no cinema americano) às produções daquele cinema ligeiro e popular. "Matar ou correr" e "O homem do Sputnik" são dois grandes exemplos disso, indo da paródia ao cinema americano (com o primeiro) ao argumento mais politizado (com o segundo), sem perder o humor calcado no carisma de Oscarito. Ambos os filmes são dos meus preferidos de todas as "chanchadas", junto a "Os dois Ladroes" e "Nem Sansão nem Dalila".
Minhas memórias do Manga iniciam-se, portanto, antes mesmo de conhece-lo pessoalmente.
Pois muito bem, era chegado o dia de conhecer o "Manga", figura mítica do nosso cinema, as pernas estavam bambas, e eu queria que ele soubesse de todo esse meu fascinio por aquela epoca e pelos filmes que dirigiu.
Foi quando entrou na sala do Projac, acompanhado de Federico Bonani, querido diretor de sua equipe que o apresentou para mim. Meus olhos brilharam; falei logo que era fã dos seus filmes estrelados pelo Oscarito, sabia que o comediante era uma figura importante na trajetória dele. Manga, emotivo e de frases de efeito, como sempre foi, apertou minha mao e arrematou:
- Oscarito era um gênio. O maior ator do mundo! - fiquei radiante; concordo com ele!


Dali, o trabalho seguiu, com núcleo do Manga e direção geral de outro querido, Ulysses Cruz. O "Sítio" estava sendo reestruturado pela emissora. Eram já quatro anos no ar e o programa ganhava uma nova direção de peso para reavivá-lo. Tim Rescala assumia a direção musical e a figurinista Luciana Buarque relia as roupas dos personagens sob uma leitura mais rural, mais simples.
Lembro de receber um elogio do Manga ao meu Saci, acho que numa festa organizada pela produção: "O seu olhão está bom, hein! Continua, continua!"
O programa ainda ganharia prêmio e eu veria o Manga todo bem vestido, como sempre em ocasiões especiais, na Casa Julieta de Serpa, no Flamengo, orgulhoso da láurea à obra de Monterio Lobato.
Quando a temporada e aqueles seis anos de "Sítio" chegaram ao fim, a necessidade de seguir trabalhando e a incerteza quanto ao que viria profissionalmente, me fizeram criar coragem e chegar a Manga e Ulysses para dizer: "Soube que irão fazer uma novela. Me levem! Preciso trabalhar!" Eu estava chegando aos dezoito, dezenove anos, e naquela altura, depois de muitos anos empregado e com uma idade, em que a maioria das pessoas começam efetivamente a trabalhar, eu não queria nem podia ficar parado.

A produção seguinte do Manga era a novela era "Eterna Magia" (2007), primeira obra solo da Elizabeth Jhin, trabalho que enfrentou rejeição do público ao tema da cultura celta e das valentinas. Ulysses queria que eu fizesse um padre, que teria uma historia de preconceito racial, algo assim, mas não fiquei com o papel pois a equipe de direção me achou jovem demais para o papel. De fato, eu era. Lembro do Vavá Torres, caracterizador, pondo um cavanhaque postiço para eu fazer um teste. Nao deu. Mas Manga e Ulysses, esses dois diretores importantes na minha vida, decidiram que eu faria outro papel na novela! Que alegria! Eu precisava mesmo nao parar de trabalhar, comecei cedo, dependia daquilo existencial e materialmente. Decidiram que eu faria um papel, só nao sabiam qual nem quando entraria no ar, devido, principalmente, aos ajustes que a novela sofreu no ar.

Os meses se passaram, via meus amigos em cena - Lara Rodrigues, Isabelle Drummond também recem saídas do "Sítio" atuando -, as pessoas perguntando quando eu entraria em cena, e eu não sabia o que dizer. Estava deprimido, de verdade. Recebia, mas nao trabalhava. Até o dia, um domingo melancólico em fim de tarde, em que Ulysses enviava um email avisando que tinha chegado a hora. A novela estava quase acabando. Brinco dizendo que entrei aos quarenta do segundo tempo. Beth Jhin tinha escrito um papel reunindo várias caracteristicas minhas, o que, apesar do tempo que fiquei esperando, me deixou muito honrado - Beth, aliás, é uma pessoa muito afetuosa, generosa, espiritualizada. Meu personagem, Tadeu, tocava violino, como eu! Era irmão do padre que, inicialmente, eu faria, e surgia na trama fugido do seminrio Calaça, de Minas Gerais, porque queria ser artista, e não padre.

Fiquei um pouquinho mais de um mês no ar mas foi bom. Por alguns motivos: pelo carinho da escrita da Beth, que nem me conhecia pessoalmente mas me presenteou, estabelecendo um elo de trabalho a partir dali, que se estendeu para sua novela seguinte ("Escrito nas estrelas"); pela oportunidade de estar em um elenco de primeira grandeza, que reunia nomes como Irene Ravache, Cleyde Yáconis, Osmar Prado, Aracy Balabanian e Cássia Kiss. Tudo isso a despeito das dificuldades enfrentadas por aquela novela. Uma produção que foi brava, lutou e passou com dignidade. E foi bom, sobretudo, pelo carinho e, posso dizer, pela fidelidade de Manga e Ulysses.

Na ocasião da novela, antes dela estrear, liguei algumas vezes para a casa do Manga para falar sobre a oportunidade de estar na novela mesmo que com outro papel. As mãos e a voz tremiam com medo de incomodá-lo, afinal ele já era um senhor de oitenta anos! Mas ele me surpreendia, recebia o chamado da empregada, falava comigo e pedia para eu ficar tranquilo. Numa das vezes disse:
-Enquanto eu respirar, você pode ligar pra mim! - num modo bem Manga de ser e que muito me honra e emociona porque "Eterna magia" foi o meu primeiro contrato como adulto, com o qual pude mudar de casa para o Rio de Janeiro, o início de um novo ciclo na minha vida.
Quando entrei na novela, Manga me chamou em sua sala e disse:
-Não falei que você ia fazer a minha novela? Prometi e cumpri.
A personalidade de Manga era forte, daquelas de que era infinitamente melhor receber elogios, pois sua voz e seu rigor eram igualmente fortes, explosivos. Tive a felicidade de dois encontros profissionais com ele nos quais senti a grandeza de sua experiência e também de seu carinho e de sua generosidade comigo e com outros colegas.
Manga tinha um estilo próprio: magnético, elegante, apaixonado por Felini, uma personalidade sedutora.... Trazia o charme de uma escola de direção (dos anos 50, 60) que já não existe mais e de um modo particular, Manga era grande contador de histórias, um show-man! Uma enciclopédia e um ícone do cinema e da televisão brasileira.
Que honra eu tive de trabalhar com o Manga e participar de seus dois últimos trabalhos! Levarei esta lembrança para toda a vida.


"Manguianas":
- A "praia" do Manga era mesmo o cinema, sua paixão! Quando assumiu o "Sítio", lembro dele dizer que não gostava muito de teatro.  E falava abertamente, sem medo. Há tanta gente que não gosta de teatro e tem medo de dizer que não gosta. É um direito.
- Há um pensamento dele que nunca esqueci. Ele disse, certa vez: "O que o diretor não entende é que todo autor é um pouco diretor; e o que todo autor não entende é que todo diretor é também um pouco autor". Achei esse pensamento curiosíssimo, e logo o estendi, até hoje, à relação diretor-produtor e ator-diretor.








sábado, 5 de setembro de 2015

Artigo sobre obra de Antony Gormley

No final de 2013, tive a felicidade de ver publicado pela Revista Valise, do Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), um artigo escrito por mim sobre a obra do escultor britânico Antony Gormley, que em 2012 teve mostra retrospectiva de seus trabalhos exposta no Centro Cultural Banco do Brasil (Rio e São Paulo).
No link abaixo, o artigo:
Na ocasião da mostra, fiquei impressionado com a capacidade da obra do escultor de mobilizar a cidade com suas esculturas. Isto porque muitas delas eram instaladas ao ar livre, em pontos urbanos de extrema circulação, buscando chamar o indivíduo à percepção de seu corpo (e anatomia) na interação do primeiro com o espaço, nas mais variadas posições e possibilidades. Buscando um diálogo entre o que chamei de "corpos-escultura" com o dramático (minha área mais imediata), fui instigado por matéria do jornalista Gilberto Scofield Jr. para o Jornal O Globo, e tracei uma relação entre um sentido possível de dramático nas obras do escultor britânico e o conceito "teatro pós-dramático" (proposto pelo teórico teatral alemão Hans-Thies Lehman). O trabalho foi também oportunidade para perceber interações históricas entre a escultura e poéticas do dramático, como o drama burguês (do século XVIII, período em que escultura e drama partilhavam a predominante visão ligada à então emergente classe burguesa da narrativa e de uma temporalidade linear e ascensional). 

A mostra foi, sem dúvida, uma das exposições mais marcantes a que já assisti, e a obra de Gormley passou a fazer parte das minhas principais referências de arte contemporânea.


sexta-feira, 4 de setembro de 2015

Ao mestre mestre Rufino!

Faço aqui homenagem ao historiador e professor Joel Rufino dos Santos, que morreu hoje (4/9/15). Destaco de sua vasta obra, de mais de cinquenta livros publicados, "A história do negro no teatro brasileiro", obra que vem a ocupar lugar ainda tão carecente de pesquisa que é o olhar sobre a contribuição dos negros nas artes dramáticas brasileiras, com a constatação de que tanto sua invisibilidade quanto sua presença nos palcos ao longo do tempo refletem um país marcado por séculos de escravidão, atávico preconceito e a necessária criação de formas dramáticas populares e alternativas - como as óperas populares dos desfiles das escolas de samba, que este que vos escreve pesquisa. Tive, na noite de lançamento do livro, a oportunidade de conversar com o professor Joel sobre a presença atual do negro no teatro, no cinema e na televisão. Ele sinalizou um olhar positivo acerca das conquistas nesse tocante até aqui, mas sem apontar também a necessidade de mais avanços. Depois disso, mantivemos uma breve e estimulante troca de e-mails, nas quais ele foi sempre afetuoso. Gostaria de tê-lo como interlocutor ainda muitas vezes. Recebo com enorme tristeza a morte desse intelectual tão generoso.