Por ora ainda aniversaria o Rio de Janeiro, a semana é toda sua, pois que no último dia primeiro a "maravilhosa" chegou ao marco eloquente dos 445 anos - com corpinho de vinte, diga-se -, apesar de todos os atentados diários à sua santidade na tural e cultural.
Reverência minha não excessiva - cidade margeada de praias; paraíso balneário onde a democracia faz-se presente, sobre as suas areias e seus calçadões, pelo menos nos instantes de fuga do calor desumano que faz por aqui e desconhece classe social; cosmopolita; reduto permanente de significativa fatia da intelectualidade nacional (esta no mais das vezes boêmia e notívaga); tudo isso despertado por poetas não só da beira-mar como também pelos bambas "baixados" dos morros, terreiros e subúrbios -, esta cidade têm origem beata: São Sebastião do Rio de Janeiro. Quem diria, tão profana na "alma encantadora de suas ruas", como dissera um dia João do Rio, foi batizada, num janeiro qualquer dos mil e quinhentos, com o nome do francês que, soldado, contrariou as ordens do Imperador romano Diocleciano ao tratar de forma branda os cristãos, em vez de perseguí-los, o que lhe causou a morte a flechadas e, postumamente, por isso, o título de santo e protetor dos cristãos.
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Contudo, quero, há muito, me redimir de uma promessa um dia feita a mim mesmo e não cumprida: traduzir em algumas palavras a emoção que senti ao caminhar pela Avenida Paulista pela primeira vez. O leitor pode considerar inoportuna minha pequena invocação dos sortilégios paulistanos - quando ainda os deuses cariocas agitam em dionisíaca e interminável balada no monte olimpo-Pão de Açúcar da imaginação dos que escrevem exclusivamente sobre a cidade, que figura soberana na prosa sofisticada e elegante de Machado de Assis e , antes, recebeu a real corte portuguesa de Dom João VI, sendo sede do único império europeu fora da Europa.
Persistindo na heresia, São Paulo, centro da pujança econômica de uma letárgica América Latina da qual faz parte, mola propulsora que atrai todo o país para si, simbolizada na avenida que não dorme - caminhar por ela foi umas das grandes emoções da vida! Até então nunca tinha ido à Nova Iorque (nem fui!), mas acreditei, não sei por que, que devia ser parecido com aquilo: repleta de opções nos cartazes, iluminada, farta, a eloquência "concreta", elegante, austera e cinza de asfalto e arranha-céus... A São Paulo dos teatros de todas as estéticas e de todos os públicos presentes-pagantes (pelo menos mais que no Rio)...
Seus arredores tradicionais (Anhangabaú, Viaduto do Chá, Augusta, Praça Roosevelt, Ipiranga e São João – acho que entendi a emoção de Caetano! -, Largo de São Franciso, Sé, Ibirapuera...). Não, por São Sebastião!, era para eu citar aqui Ouvidor, Rio Branco, Paço, Passeio, Praça Mauá, Praça Onze, Lapa, Cinelândia, Candelária, Ipanema, Copacabana...
São Paulo de Piratininga: mais um local abençoado pela fé católica portuguesa e, em breve, brasileira. Em suas largas vias e avenidas poderia hoje Paulo de Tarso – Saulo antes da conversão - ressuscitar e, apóstolo, caminhar e difundir a teologia cristã. Da cidade Piratininga, que, segundo me consta é também nome de peixe, disse um "desconhecido" padre de horas vagas que, na verdade gostava mesmo era de brincar de dramaturgo como forma de catequese, José de Anchieta:
"A 25 de Janeiro do Ano do Senhor de 1554 celebramos, em paupérrima e estreitíssima casinha, a primeira missa, no dia da conversão do Apóstolo São Paulo, e, por isso, a ele dedicamos nossa casa! "
"Nossa casa" São Paulo de Macunaíma, em que Mario de Andrade, movido por pesquisa e genialidade, captou sua essência e chamou de "cidade macota lambida pelo igarapé tietê", mesmo Tietê que hoje anda transbordante de água suja e de águas diluviais que parecem anunciar o fim do mundo. Tietê, que poderia retornar-se a si mesmo na História e chamar "Tininga" (seco, em tupi), onde já não tem mais "pira" (peixe, no mesmo dialeto). E "nossa casa" que Zé Celso Martinês Correa vislumbra no futuro chamar SamPã, terra signo do cosmopolitismo e palco constante de uma construção urbano-artística dionisíaca.
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Para terminar, retorno ao Rio e a Sebastião padroeiro, ambos um único corpo ainda aniversariante. E assim como a canção de Gil e Milton, a Sebastião, "diante de tua imagem tão castigada e tão bela", pela cidade do Rio de Janeiro, "peço que olhes por ela".
Esse município criado a partir da sua generosa baía-mãe, chão tão cobiçado pelas incursões de aventureiros e corsários, que por pouco não seguiu sede da França Antártica de Villegagnon e fez disso tudo uma outra epopéia - não sei se melhor ou pior - mas totalmente diferente com certeza. Uma cidade que, neste momento, tão combalida – irônico é o Destino - depende das alvíçaras de Copa do Mundo e de Olimpíadas.
São Sebastião, protegei o nosso Rio de Janeiro! E, se possível, nossa São Paulo também!
Izak Dahora
2 comentários:
Adorei!!! É bom saber que você continua se expressando muito bem, até melhor, jurei estar lendo palavras de um escritor bem famoso, até quando me dei conta de que realmente estava. Para mim, você sempre será meu grande amigo e é sempre agradável sentar para ler/ouvir o que você tem a dizer, é sempre interessante! Continue, você faz alguém sentir-se bem, como se esse alguem estivesse dirigindo numa estrada deserta, com o vento batendo no rosto e ouvindo uma boa música. Beijos e abraços!
Fico feliz de te apresentar a querida paulista,o Vale do Anhangabaú (que pelo menos por enquanto é pra mim o lugar mais belo de Sampa, visto do viaduto do cha num dia típico da cidade: chuva, ceu cinza,garoa...)e os outros pontros que vc mencionou.Mt feliz mesmo!!!Fiquei te devendo outras coisas: Masp (um lugar que nunca entrei), a tal da ponte nova na marginal pinheiros,museu do ipiranga,um pastel de queijo com caldo de cana em alguma feira livre, o samba rock (que os paulistanos acabaram de apropriando bastante, diga-se de passagem, rsrsrsrsrs,Pinacoteca do Estado,a feira da liberdade museu da lingua portuguesa, estação da Luz, a parada gay (esta só em junho), a intervenção bovina pela cidade (procure as vacas na internet, vc vai adorá-las!!!), o hip hop da zona leste e seus Bboys da Galeria Olido, a catedral da Sé,teatro Municipal, sala São Paulo,alguns muros que têm uns grafites que gosto muito, crackolandia(afinal são paulo não é feita só de coisas lindas) a estação Sé no horário de pico...rsrsrsrs enfim...São Paulo é grande demais pra conhecer em 3 dias.Somos uma formiguinha nela.Mas ela tem as portas bem grandes que ficam bem abertas.Fico feliz por gostar tanto da minha cidade berço.
bjs grandes.
vou continuar saboreando teu blog!
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