domingo, 27 de fevereiro de 2011

Aretha e areté.



Para quem é um aficcionado por mitologia grega como eu, tudo é motivo pra ler, reler e vasculhar os sentidos possíveis que emanam daqueles mythos ou, mais simplesmente, daquelas histórias. Arquétipos e símbolos são muitas vezes as senhas para um entendimento mais amplo da existência, e das passagens muitas vezes fantásticas e metafóricas da mitologia é possível extrair grandes ensinamentos, como ocorre na leitura da própria bíblia. E se a vida e o mundo se transmutam ao longo dos tempos, sua essência não parece diferir em muita coisa, e isto se comprova na torrente das paixões humanas que sempre nos tomam e arrebatam desde os gregos e suas histórias e desde antes deles mesmos.

As descobertas de etmologia (história ou origem gramatical de termos e nomes, seus elementos constituivos e sua evolução) também são um prato cheio para quem desfruta mitologia. A minha última descoberta foi na verdade confirmação de um sentido que já tinha aprendido lendo alguma publicação sobre Grécia Antiga há muito tempo.

Aretha - esse nome não me saía da mente! E algo me dizia que eu já conhecia o que esse nome significa etmologicamente.

Lembrei, então, que Aretha tem o mesmo radical de areté, atributo dos antigos herois gregos, além da mesma sonoridade cuja tônica aberta/vocálica remete instantâneamente à língua de Homero. Fui à fonte e lá estava:

"Os gregos reverenciavam os herois (...), homens que haviam realizado feitos extraordinários e que, uma vez mortos, haviam se transformado em deuses. O mais famoso dos herois gregos foi Hércules. O heroi é o homem que possui areté, palavra grega que significa a excelência humana (a força, a destreza, a coragem, o espírito guerreiro). Somente os aristocratas teriam areté . O homem nobre era aquele que tanto na vida privada quanto na pública , era regido pela coragem, pela força e por qualidades e normas de conduta que normalmente não são exigidas ao homem comum"

Já em dicionários de significados de nomes na internet pude ver que Aretha é descrito como virtude ou dignidade e na mesma procedência grega. O que está absolutamente dentro do contexto por mim antes lembrado e pesquisado.

Como já disse, tudo é motivo para que eu mergulhe numa leitura ou numa boa discussão sobre mitologia e Grécia antigas. Sendo que, desta vez, o motivo étymos (verdadeiro) da minha busca foi a origem do nome de uma moça linda que conheço.E ela realmente mereceu distinção nos meus pensamentos, não é um ser comum... Tem areté.



Izak Dahora

domingo, 13 de fevereiro de 2011

Diegues disse.




Assistindo aos extras do dvd do filme 5x Favela uma das várias coisas interessantes faladas pelos mais experientes em encontros e oficinas com os jovens cineastas e técnicos do filme me marcou e, por isso, pincei para expor aqui.

Disse Cacá Diegues, um dos produtores do filme - e "padrinho" e "benfeitor" do longa, no  melhor sentido do termo - aos novos diretores sobre como dirigir atores:

"Ator é que nem gente. Tem um que é mais chegado, outro que é mais distante; há aquele que fala muito, outro que é mais frio; um mais emoção, outro mais racional...E o importante (em outras palavras, pois já não me recordo na íntegra) é entender como cada um funciona para que se extraia da biografia desse ator aquilo de que o personagem e o filme precisam (...)".

É claro que muitos diretores já teceram comentários sobre esse cuidado necessário com o intérprete - uns de verdade, muitos por  vaidade simulando generosidade, outros tantos por força do clichê sem muito bem o ator, de fato, compreender... Mas acho que vale registrar tais palavras pois um diretor - e agora é um ator que fala - consciente de que ator é ser humano, portador de especifidades múltiplas, qualidades que o tornan singular (na vida e na cena) e que divide com o diretor a construção do todo, sem hierarquias, causa  sempre satisfação e, por vezes, até mesmo espanto. E Diegues, marxistamente inspirado, invariavelmente se mostra bastante franco e politizado e não precisa, a essa altura do campeonato, fingir pensar o que não pensa.

É isso mesmo Cacá, ator é que nem gente.



 Izak Dahora

sábado, 12 de fevereiro de 2011

Confidência da febre.

Tenho na gaveta – ou melhor, nos arquivos do meu computador – entre outros tantos projetos, uma peça e um romance. Na verdade ainda mais o sonho em tentativa de andamento de uma coisa e outra. Devo trabalhar neles há uns três anos desde que tive as ideiais iniciais. E as dificuldades têm sido duas: tempo para me debruçar sobre eles, já que tenho que trabalhar e honrar os compromissos da vida adulta e porque faltam algumas vezes ideias para solucionar questões que eu mesmo crio nas minhas ficções.

E no meio disso tudo tem a música, meus poemas, a vida...

Talvez me falte também maturidade e minhas tão sonhadas obras tenham que esperar mais outros três anos, quem sabe? Edney Silvestre não teve que trabalhar e pesquisar, simultaneamente à atribulada vida de jornalista, vinte anos até que concluísse o reconhecido “Se eu fechar os olhos agora”? Sua espera e trabalho vieram, inclusive, premiados, de um prestigioso Prêmio Jabuti 2010. E assim for a com outros tantos escritores e outras tantas obras.
Compartilhei um pouco da minha febre criativa aqui no blog. E sei que isso não foi em vão: minhas ideias respirarão nessa espécie de work in progress. E o retorno dos que lerem essa confidência também encherão de ânimo e frescor meus projetos. Tenho certeza.



Izak Dahora.

sábado, 5 de fevereiro de 2011

Do que tenho lido: Nietzsche e a tragédia grega.

"(...) Para servir-nos da terminologia de Platão, poderíamos dizer, das figuras trágicas do palco helênico, mais ou menos isto: o único Dionísio verdadeiramente real aparece em uma pluralidade de figuras, sob a máscara de um herói combatente e como que emaranhado na rede da vontade individual. E assim que o deus ao aparecer, fala e age, ele se assemelha a um indivíduo que erra, se esforça e sofre: esse, em geral, aparece com essa precisão e nitidez épicas, isso é o efeito de Apolo, esse decifrador de sonhos, que evidencia ao coro seu estado dionisíaco por meio dessa aparição alegórica. Em verdade, porém, esse herói é o Dionísio sofredor dos Mistérios, aquele deus que experimenta em si o sofrimento da individuação, do qual mitos maravilhosos contam que, quando rapaz, foi despedaçado pelos Titãs e nesse estado é venerado como Zagreu: o que sugere que esse despedaçamento, em que consiste propriamente a paixão dionisíaca, equivale a uma transformação emar, água, terra e fogo, e que portanto temos de considerar o estado da individuação como a fonte e o primeiro fundamento de todo sofrimento, como algo repudiável em si mesmo. Do sorriso desse Dionísio nasceram os deuses olímpicos, de suas lágrimas os homens. Nessa existência como deus despedaçado, Dionísio tem a dupla natureza de um demônio horripilante e selvagem e de um soberano brando e benevolente. Mas a esperança dos epoptes era um renascimento de Dionísio, que agora pressentimos como o fim da individuação: era para esse terceiro Dionísio vindouro que soava o fervoroso canto de júbilo dos epoptes. E somente nessa esperança há um clarão de alegriano semblante do mundo dilacerado, destroçado em indivíduos: assim como o mito o mostra na imagem de Deméter mergulhada em eterno luto, que pela primeira vez se alegra ao lhe dizerem que pode dar à luz Dionísio mais uma vez. Nas intuições mencionadas temos já todos os componentes de uma visão do mundo profunda e pessimista e com eles, ao mesmo tempo, a doutrina da tragédia que está nos Mistérios: o conhecimento fundamental da unidade de tudo que existe, a consideração da individuação como o primeiro fundamento do mal, a arte como a alegre esperança de que o exílio da individuação pode ser rompido, como o pressentimento de uma unidade restaurada. (...)"

                                        Friedrich Nietzsche - "O Nascimento da tragédia no espírito da música".